Os últimos anos de Marilyn Monroe – Keith Badman



Ninguém poderia prever o que aconteceria na naquela madrugada de 5 de agosto de 1962. Marilyn havia tido um dia anormalmente difícil numa semana que lhe trouxera boas novas – sobretudo a retomada do seu vínculo com a 20th Century Fox para filmagem de Something’s Got to Give. Não conseguiria se acalmar e dormir sem ajuda dos seus remédios. Mas algo saiu terrivelmente errado naquele dia e, depois de misturar compostos que não poderiam ser ministrados conjuntamente (hidrato de cloro e Nembutal), a atriz parou de respirar.

Ou será que não foi bem assim?





Poucas mortes em Hollywood são cercadas de tanto mistério como a de Marilyn Monroe. Alguns, partindo do histórico depressivo e solitário da atriz, defendem o suicídio;  outros, acusam a família Kennedy de assassinato; existe a tese de que o ocorrido foi, na verdade, um acidente; e há quem defenda até que a morte decorreu do seu envolvimento com a máfia norte-americana.

Em Os últimos anos de Marilyn Monroe, Keith Badman se propõe a investigar a fundo o dia a dia de Marilyn nos dois anos que antecederam aquela madrugada de 5 de agosto e apresentar a que julga ser a verdadeira história por trás da sua morte. Quatrocentos e cinquenta e sete páginas depois pode-se dizer qualquer coisa de Badman, menos que ele não cumpriu o desafio que se havia proposto.

O livro é de uma minúcia inquietante. É difícil imaginar como o autor teve acesso a tantas informações da rotina da atriz. Detalhes como a quantidade de vezes que a atriz teve que rodar uma cena, o valor das compras feitas no mercado, número do cheque usado no pagamento(!!)... Está tudo lá. E ao longo de toda a narrativa. Isso mesmo, toda a narrativa.

Embora tenha ficado tão surpreso quanto admirado com o requinte de detalhes trazidos por Badman, não consegui evitar um certo cansaço. Compreendo que as informações eram necessárias para, em certa medida, corroborar o ponto de vista do autor acerca da personalidade de Marilyn, mas lá pelo meio do livro já não conseguia me interessar em saber quanto a atriz gastou em champanhe, ou o valor do corte de cabelo feito para sessão de fotos X ou Y.

Apesar dessa ressalva, o livro merece ser lido. Talvez não como primeira leitura (por tratar apenas dos dois últimos anos de Marilyn, aqueles que não estejam familiarizados com a história da atriz prefiram uma obra mais abrangente antes de partir para o livro de Badman, que objetiva desconstruir verdades tradicionalmente divulgadas sobre a vida e morte de Norma Jeane), mas vale à pena se permitir conhecer a versão de Badman sobre os mitos que envolveram a infância da atriz, seu relacionamento  com John e Bobby Kennedy, as inseguranças que nunca lhe deixaram…  
"Como pode uma pessoa famosa como você ser tão solitária?", ele [Tom Clay] perguntou. "Você já se sentiu solitário em uma sala cheia de gente?", ela indagou. "Pois bem, multiplique isso por quarenta salas e terá uma ideia do quanto eu me sinto solitária." (p. 50)
A grande questão é que, não importa o quão profunda seja a pesquisa biográfica: ninguém será capaz de dar uma resposta cabal às perguntas que ainda permanecem em suspensão, principalmente a mais definitiva delas: Marilyn cometeu suicídio, morreu acidentalmente ou foi vítima de assassinato? A versão de Badman, que ele reputa a definitiva, pressupõe, logicamente, a aceitação irrestrita de suas premissas para que se torne verdadeira. Mas se algum dado de realidade não for aceito, desmorona tal qual um castelo de cartas.

As discussões em torno da morte de Marilyn são tão mistificadas e recorrentes que parecem dispostas a obliterar seus sucessos, suas angústias, seus carinhos. O foco, inevitavelmente, acaba escapando quando voltamos os olhos para esse final trágico. Fosse eu o responsável por sua biografia faria constar como advertência primeira ao leitor: nos preocuparemos mais com a vida do que com a morte.

Afastaríamos o tom lúgubre e poderíamos enxergar com mais clareza o amor incondicional de DiMaggio – cujas últimas palavras foram “finalmente vou ver Marilyn” –, a devoção fraternal de Pat Newcomb, a força da personalidade de Marilyn – que, para desfazer rótulos, primeiro os abraçava: ela não negava sua sensualidade, mas mostrava em cada foto que não era apenas uma mulher belíssima. Havia mais por trás do seu sorriso, um tom de desafio, uma fresta de solidão.



Antes de deixar o bangalô, Marilyn, curiosamente, admitiu que não tinha queixas da sua vida. "Se cometi meus erros", ela declarou, "eu fui a responsável". E acrescentou: "Existe o agora e existe o futuro e mal posso esperar por ele. Deverá ser muito interessante."[George] Barris se despediu e partiu ao som de uma canção de Judy Garland, "Who cares", que tocava alto no toca-discos de Marilyn (p. 287)

A eterna mulher do vestido esvoaçante de The Seven Year Itch nunca superou seus traumas de infância e, ao que consta, jamais conseguiu aplacar a solidão. Ainda assim, fez do seu sorriso uma referência – até 2010, a atriz era, depois de Elvis Presley e juntamente com James Dean, uma das celebridades mortas mais rentáveis do mundo - e viveu intensamente seus 36 anos. Pudesse Marilyn voltar por um dia, ficaria feliz por saber que não foi esquecida.




Os últimos anos de Marilyn Monroe – Keith Badman
Editora: Benvirá
Número de páginas: 457

4 comentários:

  1. Renato suas considerações são muito boas. você escreve sensivelmente, e isto na literatura é bom. Sobre o conteúdo, seu texto não se trata de um resumo de fatos escritos, e sobre os acontecimento da vida do bibliografado, eu não saberia dar uma opinião, li várias biografias da MM, então confundo os conteúdos dos livros, só guardo na verdade as contradições, dado que a biografia é o relato de um vida, as informações encontrada/iguais eu tenho como verdadeiras então fico na dúvida de que livro saiu.

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  2. Jéssica, seja bem-vinda! Muito bom tê-la por aqui.
    Também quero ler outras biografias dela, fiquei muito curioso em conhecer outras perspectivas.
    Volta sempre, tá?
    Abraço!

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  3. Oi Renato!
    Você deixou um recado no Skoob, e vim conferir sua resenha!!

    Como você citou, este livro foca os últimos anos, então acho que meu 'aproveitamento' não foi tão bom, pois haviam alguns fatos que não conhecia, então tinha que correr pro Google pra entender um pouco melhor!!

    Gostei muito da sua resenha, concordo com suas opiniões!

    Bjo!

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    Respostas
    1. Giovana, seja muito bem-vinda!
      Essa ressalva é mesmo necessária: a proposta do livro vai ser melhor abraçada se já houver, por parte do leitor, um conhecimento prévio da história de Marilyn.
      Gostei muito do seu comentário! Volte quando quiser!
      Beijo!

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